Adriano Benayon |
2011-10-19 - *Adriano Benayon
1. Crescem os
protestos contra as intoleráveis injustiças sofridas pelos povos em grande parte
deste mundo. Na Espanha, na Itália, na Grécia e em Portugal surgem grandes
manifestações, desencadeadas pelo brutal aumento dos sacrifícios exigidos dos já
sacrificados, pelo Fundo Monetário Internacional e pelo Banco Central Europeu, a
fim de beneficiar bancos europeus e estadunidenses. [1]
2. Experiência
semelhante foi suportada, muitas vezes, por países latino-americanos. Entre eles
o Brasil, que está menos distante do que imagina de mais uma crise nas contas
externas, acompanhada de agravamento das já degradadas condições de vida da
maioria de sua população.
3. Merecem atenção
também as manifestações de resistência civil nos EUA e Reino Unido (Inglaterra),
sedes da oligarquia financeira que comanda a tirania mundial. Especialmente, o
“Ocupemos Wall Street” aponta para o
alvo correto: os grandes bancos internacionais, cujos controladores e associados
dominam não só as finanças, mas também o petróleo, os armamentos, a grande
mídia, a indústria químico-farmacêutica
etc.
4. Em suma: os
concentradores do poder econômico-financeiro exercem absolutismo político cada
vez maior, mandando nos governos “democráticos” eleitos pelo dinheiro e pela
mídia. Esses não passam de gerentes da “democracia” e do cinismo que dá esse
nome à tirania e que chama de liberdade a opressão, e de defesa de direitos
humanos o genocídio cometido contra nações com armas de destruição de
massa.
5. Se, em muitos
países há alguma consciência da fonte do problema, no Brasil o povo parece
anestesiado pelo ópio da TV enganadora. Os governistas pintam tudo de cor de rosa,
como se não houvesse razão para manifestações contrárias ao status quo, enquanto
oposicionistas, ainda mais submissos ao império, tentam capitalizar o élan dos
indignados com a corrupção.
6. Os promotores das
marchas “contra a corrupção” não entendem ou fingem não entender que - embora
ela seja praticada por políticos e por muitos do serviço público - a
mega-corrupção começa no setor privado, especialmente nas transnacionais
sediadas no exterior, grandes beneficiárias das políticas públicas implantadas
no País desde 1954.
8. O Brasil só faz
figura de potência emergente para quem gosta de se iludir. A pobreza da grande
maioria e também o atraso relativo do País resultam do modelo de dependência
financeira e tecnológica. Ele não foi implantado por equívoco, mas de caso
pensado: foi desenhado para isso, sob a influência e a pressão das potências
imperiais que intervieram em 1954, 1961, 1964 e organizaram, entre 1982 e
1988, a
pretensa volta ao “regime democrático”
10. Esta constitui
enorme fardo, que inviabiliza o desenvolvimento do País, reduzindo a níveis
ridículos os investimentos da União Federal e dos Estados. Aquela assumiu as
dívidas destes e lhes exige juros tão absurdos como os que ela própria paga ao
sistema financeiro.
11. Formou-se assim o
esquema de quádrupla sugação dos brasileiros: a primeira, pagar impostos
altíssimos e mal distribuídos: os pobres (mais de 83% da população) entregam
mais de 30% do que ganham; os de renda média (menos de 15% da população) têm
carga tributária acima de 50%, e as grandes empresas, bancos e outros
investidores, além de poder evadir impostos, só são tributados nos ganhos
financeiros em, no máximo, 15%.
13. Os pobres e a
classe média são mal atendidas ou nem o são, porque não têm como pagar clínicas,
hospitais e escolas privadas, de qualidade, de resto, questionável e favorecidas
pelo mercado com que o Estado lhes presenteia ao não proporcionar esses serviços
à sociedade.
16. Exemplo gritante é
a indústria automobilística transnacional favorecida com subsídios escandalosos
desde o golpe de 1954, aumentados por JK. Isso prossegue, até hoje, com
empréstimos do BNDES a juros baixos e outras benesses prestadas às
transnacionais em geral.
17. De fato, elas se
cevam também com incríveis subsídios à exportação, desde o final dos anos 60
(Delfim Neto), - isentadas de gravames em suas superfaturadas importações – bem
como com a isenção do ICMS na exportação, presenteada pela Lei Kandir/Collor.
Cresceram no Brasil com capital formado no próprio mercado brasileiro e com
dinheiro público.
18. Este ano, em oito
meses, só as montadoras de veículos transferiram ao exterior mais de US$ 4
bilhões em lucros registrados, o que não inclui os ganhos com o subfaturamento
de exportações e o superfaturamento de importações, nem os serviços
superfaturados ou fictícios pagos às matrizes.
19. Agora, e mais uma
vez, as montadoras estrangeiras foram agraciadas com proteção à “indústria
nacional”, mediante elevações do IPI para veículos importados, alegadamente para
evitar a “invasão” de carros chineses e coreanos. As montadoras aqui instaladas
estão livres do IPI majorado, utilizando 65% de componentes produzidos no
MERCOSUL. A reserva de mercado, que não
existe para a indústria nacional, mesmo porque acabaram com ela, tornou-se
política governamental para favorecer os “investimentos diretos estrangeiros -
IDES”.
20. Os IDEs estão na
raiz dos problemas, inclusive o da dívida interna, cujos juros são a expressão
maior da submissão do País à escravização financeira, em nível injustificável
conforme os parâmetros que balizam as
taxas em todo o mundo. Por isso, a dívida adveio da capitalização de juros,
estando os bancos e os aplicadores
financeiros entre os grandes beneficiários do modelo econômico e político que
inviabiliza o Brasil como nação.
21. Para concluir: sem
liderança capaz de compreender as grandes sugações e de identificar os
causadores delas, não há como fazer que qualquer movimento popular leve às
transformações que se impõem, por mais que ganhe ímpeto em função das
insuportáveis condições de vida do povo.
*Adriano
Benayon
é Doutor em Economia e autor de “Globalização versus Desenvolvimento”
Recebe
e-mails em:
abenayon.df@gmail.com
Nota de
rodapé
[1] Em Barcelona,
15.10.2011, 250 mil pessoas, segundo os organizadores, participaram de marcha
encabeçada por cartaz onde se lia “Da
indignação à acão. As nossas vidas ou os lucros deles”. Em Sevilha: 50 mil
pessoas, com gritos de “Chamam-lhe
democracia, mas não é”; “A solução:
banqueiros na prisão”.
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