9/3/2012, Leslie H. Gelb, The Daily Beast
Traduzido
pelo pessoal da Vila
Vudu
Mas,
dado que a imprensa-empresa insiste em nos tratar como se fôssemos sábios e em
ignorar os horrendos erros que cometemos, nós seguimos com nosso joguinho, e,
com isso, provocamos danos terríveis. Aí vão alguns exemplos recentes de o
quanto somos ignorantes e perigosos, e de por que todo o público externo deve
desconfiar muito e guardar a máxima cautela sempre que ouvirem ou lerem
“verdades” e “conclusões” e “certezas” enunciadas pelo meu clã de
especialistas.
Sen.
Lindsey Graham, R-Carolina do Sul, exibe foto de um míssil iraniano coberto com
propaganda anti-Israel, no Capitólio, em Washington, 3ª-feira, 16/2/2012 (Foto J. Scott Applewhite / AP Photo) |
O
que todos sabemos com certeza é pouco: o Irã está enriquecendo urânio e tem
capacidade para enriquecer quantidade suficiente de urânio para fabricar bombas
nucleares dentro de – talvez – um ano, dois anos, talvez mais tempo. É possível
que o Irã esteja desenvolvendo outras capacidades necessárias para pôr aquele
urânio em forma de bomba ou míssil e instalar a bomba ou míssil num equipamento
de transporte e detonação. Essa é a informação que nos chegou, até agora, por
vídeos e áudios da inteligência.
Essas
atividades são motivo para preocupações? Sim, sem dúvida. Mas não são motivo
para guerra ao Irã, nem agora nem em breve. São motivo, sim, para que EUA,
Israel e outras nações procurem acumular mais e mais informação confiável, e
para que ponham a funcionar os órgãos de diplomacia. De diplomacia, é claro,
porque se pode discutir até o dia do Juízo Final sobre o que têm e planejam os
iranianos, mas só se formos capazes de oferecer propostas que se possam discutir
e analisar teremos meios para testar nossas hipóteses. Se o Irã rejeitar
propostas razoáveis, então, sim, haverá motivos para suspeitas, e a guerra
poderá começar a impor-se como última via inafastável.
Devo
dizer que essa não é posição só minha. É posição também consensual nas agências
de inteligência dos EUA. E não há de ser por acaso que, desde alguns dias, até
veteranos espiões israelenses, notórios cérebros da inteligência de Israel e
militares de alta patente tenham-se posto a gritar de todos os telhados,
publicamente, em movimento tradicionalmente oposto ao código de silêncio que
rege esses assuntos.
Os
falcões linha mais dura, israelenses e norte-americanos não se cansam, por sua
vez, de dizer que não há motivos para que nos preocupemos com as consequências
de atacar o Irã; que os iranianos não podem fazer, ou não se interessarão por
fazer coisa alguma que nos cause grave dano. Epa! Protejam a cabeça e o bolso!
Como poderiam saber se Teerã, se for atacada, não decidirá retaliar e atacar,
digamos, campos de petróleo sauditas ou iraquianos, lançando os preços de
petróleo à estratosfera? Ou como alguém pode saber se os terroristas não optarão
por atacar norte-americanos, israelenses e outros, em todos os cantos do mundo?
Sim, é claro: eu também não sei. Mas esses são riscos reais que é preciso
reconhecer e aceitar, antes de decidir atacar o Irã.
Ou
tomem o caso da Síria. Os gêmeos pró-guerras-em-geral, senadores John McCain e
Lindsey Graham, além da usual coorte de neoconservadores desatinados e
intervencionistas “humanitários”, bradam a favor de ação militar. Querem ataques
aéreos e muitas armas para os rebeldes sírios, querem “zonas aéreas de exclusão”
e coisa e tal e tal. Não suportam que o presidente Bashar al-Assad ataque o
próprio povo. Nem nós. Nem ninguém.
Mas...
Por que os neoconservadores estão tão agudamente preocupados com os vários
milhares de sírios mortos, quando se sabe que jamais perderam o sono com os
milhões já mortos e outros tantos que continuam a ser mortos na África? Por que
os neoconservadores não discursam a favor de armarmos os tibetanos? Fácil:
porque não querem guerra contra a China. Por hora, os neoconservadores só querem
inflar o orçamento militar dos EUA e que os EUA finquem pé na Ásia. Depois a
gente vê o que faz.
Se
não houver oposição clara, se os que são contra guerras não fizerem direito o
que têm de fazer, em pouco tempo os EUA estarão novamente em guerra, como
aconteceu no Iraque e no Afeganistão. E, outra vez, haverá muito a
lamentar.
Assim
sendo, é preciso começar a desconfiar de que a obcecação daqueles todos para que
Washington “avance” contra a Síria e nos meta em outra guerra inclui algo mais,
além de salvar vidas. No caso do Irã: querem enfraquecer a posição do Irã no
mundo árabe, ao lado de seu poderoso aliado sírio e ajudado por extremistas
apoiados pela Síria, como o Hezbollah no Líbano e o Hamás em Gaza. Objetivo
muito nobre.
Mas,
também aí, quais as consequências, ou melhor, os riscos, o preço? Os
intervencionistas, por exemplo, correram a armar os rebeldes sírios. Oh, nobre
povo que combatia a tirania de Assad. Lindo. Mas quem são, afinal, os tais
rebeldes? Há elementos da al-Qaeda que também lutam contra Assad? Há outros
muçulmanos extremistas, que também se opõem à tirania de Assad? E não serão, se
já não forem, ameaça muito mais grave a Israel e outros árabes, como a Jordânia,
que o próprio Assad?
Os
obcecados-por-guerras dizem que não, não, que ninguém se preocupe... Mas fato é
que não sabem responder essas perguntas. E menos ainda sabem o que aqueles
“combatentes da liberdade” da Al-Qaeda e outros farão com as armas químicas do
arsenal de Assad. Nem os intervencionistas de “intervenção-na-Síria-já” sabem
explicar como chegarão por ar à Síria; nem o que conseguirão fazer, no caso de
nem ataques aéreos conseguirem impedir que Assad continue a lutar contra a
oposição interna.
A
lista de perguntas que se deve fazer aos pregadores de guerras “humanitárias” é
longa, mas é preciso tê-la pronta e apresentá-la antes que qualquer presidente
decida desembainhar a espada.
Os
norte-americanos têm de ser protegidos dessas serpentes mercadoras de petróleo,
e só podem contar com o Congresso e com a imprensa, para protegê-los. Congresso
e imprensa, portanto, têm de trabalhar muito melhor do que até aqui: têm de
arrancar o melhor que os especialistas tenham a oferecer, sobre fatos, sobre
opiniões, sobre fatos nos quais basearam suas opiniões. Têm de fazer perguntas
fortes, que façam sentido forte, e não podem admitir que qualquer especialista
se safe de assumir compromissos difíceis. Infelizmente, nada mais raro do que
ver políticos e jornalistas decididos a apertar especialistas.
Mas,
se a imprensa-empresa fracassar outra vez, como já fracassou no Iraque e no
Afeganistão, haverá mais guerra. EUA estarão novamente em guerra, como aconteceu
no Iraque e no Afeganistão. E, outra vez, haverá muito a lamentar. Mas os
intervencionistas “humanitários” que querem guerra-já não lamentarão. Nunca
lamentam. Estão dispostos a continuar lutando todas as guerras que apareçam,
qualquer guerra, até que apareça alguma guerra, algum dia, que eles
“vençam”.
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