28/3/2012,
MK Bhadrakumar, Indian
Punchline
Traduzido
pelo pessoal da Vila
Vudu
O “microfone oculto” tem papel intrigante na diplomacia. Quando o presidente Barack Obama dos EUA e o presidente da França Nicolas Sarkozy “tricotavam” sobre o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu, no último encontro do G20 em Paris, lá estava o microfone indiscreto a captar tudo, e Paris e Washington viveram momentos de embaraço.
O “microfone oculto” tem papel intrigante na diplomacia. Quando o presidente Barack Obama dos EUA e o presidente da França Nicolas Sarkozy “tricotavam” sobre o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu, no último encontro do G20 em Paris, lá estava o microfone indiscreto a captar tudo, e Paris e Washington viveram momentos de embaraço.
Bem evidentemente, nenhum dos dois presidentes suspeitava de algum microfone indiscreto, a amplificar aqueles dois dedos de prosa “franca” sobre o quanto Netanyahu é “difícil”, como interlocutor. Mas segunda-feira, quando Obama conversava com o presidente Dmitry Medvedev, à margem da Cúpula de Segurança Nuclear, o microfone indiscreto serviu a uma melhor causa.
Obama foi apanhado, na segunda-feira, em conversa gravada, dizendo a Medvedev que os russos melhor fariam se não pressionassem demais, nesse momento, na questão dos mísseis de defesa. Obama disse que precisava de “espaço”, até que passassem as eleições de 2012: “Depois de minha eleição, tenho mais flexibilidade” – disse Obama, sem suspeitar de que a conversa estava sendo gravada por jornalistas. [1]
O contraste não poderia ser maior, se se considera o dia seguinte. Paris entrou rapidamente em ação para “matar” a gravação sobre Netanyahu e esvaziar a cáustica opinião de Sarkozy. Obama fez exatamente o oposto. Confirmou e defendeu o que dissera. No dia seguinte, explicou que “o único jeito de eu acertar essa coisa [as diferenças com Moscou sobre os mísseis de defesa] com o Pentágono, com o Congresso, é ter apoio dos dois partidos, e, sinceramente, eleições não são ambiente para discussões mais demoradas, mais ponderadas”.
Aí, Obama parece ter toda a razão. É verdade: os urubus Republicanos revoam nos tempestuosos céus da política dos EUA, dedicados a esquartejar o presidente em todo e qualquer campo, sobre toda e qualquer questão, inclusive no que tenha a ver com relações e laços com a Rússia (ou a China). E no sistema disfuncional que há hoje nos EUA, Obama também acerta, ao dizer que tentar fazer avançar qualquer tipo de ideia inovadora no front da política exterior é empreitada consideravelmente complexa.
Mas muito me intriga o impacto que esse diz-que-diz terá entre os russos e o que implicações terá no clima das relações entre EUA e Rússia. Evidentemente, os russos estão dedicados 24 horas/dia, 7 dias/semana, a prever como Obama planeja relacionar-se com a Rússia de Putin.
Obama é diplomata consumado. De fato, já virtualmente sinalizou, de Seul, que o “reset” EUA-Rússia está acionado e continua ligado, e que isso não mudará por causa da troca de guarda no Kremlin.
Por que teria optado por enviar aquele sinal? Por uma razão: é importante, para Obama, que Moscou não suba o tom, em questões que podem abalar a segurança internacional (e a reeleição de Obama em novembro), a saber: o Irã, a Síria, o Afeganistão.
Washington jogou muito pesado na campanha e até a eleição de Putin dia 4 de março. Mas os russos são gente de bom coração. Agora, Moscou pode esperar pacientemente pelo segundo mandato de Obama no Salão Oval. Afinal, já recebeu a “garantia presidencial”, no assunto de mais peso nas políticas exterior e de segurança russas, nas próximas décadas: a paridade nuclear com os EUA (que Moscou chama de “balanço estratégico”).
Obama tem boas chances de conseguir o segundo mandato, com a economia entrando em lenta recuperação. Os russos são pragmáticos e também trabalham com projetos de longo prazo.
Evidentemente, Obama supôs que a conversa com Medvedev fosse privada e confidencial. Mas, agora que caiu em domínio público, aquelas palavras terão impacto também em outros países – China, Irã, Síria etc. –, que se porão a conjecturar, a cada evento, se será caso de levar a sério o que se ouça nos contatos entre EUA e Rússia, ou se as “declarações” não passarão de retórica.
Feitas as contas, Obama vence sem dificuldade. Medvedev está correto [2]: a encenação de Mitt Romney é irracional, desconectada do espírito dos novos tempos.
Notas
dos tradutores
Obama: Em todas aquelas questões, mas particularmente nos mísseis de defesa... isso, tudo isso pode ser resolvido, mas é importante que ele me dê espaço.
Medvedev: É,
entendo o que você diz sobre espaço. É espaço para
você...
Obama: É
minha última eleição. Depois da minha eleição, tenho mais
flexibilidade.
Medvedev: Entendi.
Transmitirei essa informação ao Vladimir.”
[2]
27/3/2012, Reuters Africa, “Medvedev:
Romney's anti-Russia comment smacks of Hollywood” [Medvedev: comentários
anti-Rússia de Romney cheiram a enredo hollywoodiano]: “Recomendaria aos
candidatos à presidência dos EUA, dois cuidados: primeiro, que, ao falar, usem o
cérebro, a razão, em vez de repetir bobagens de enredo de novela; segundo, que
observem a data de hoje; estamos em 2012, não em meados dos anos
1970s”.
*MK
Bhadrakumar foi
diplomata de carreira do Serviço Exterior da Índia. Prestou serviços na União
Soviética, Coreia do Sul, Sri Lanka, Alemanha, Afeganistão, Paquistão,
Uzbequistão e Turquia. É especialista em questões do Afeganistão e Paquistão e
escreve sobre temas de energia e segurança para várias publicações, dentre as
quais The
Hindu, Asia
Online e Indian Punchline.
É o filho mais velho de MK Kumaran (1915–1994), famoso escritor, jornalista,
tradutor e militante de Kerala.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Registre seus comentários com seu nome ou apelido. Não utilize o anonimato. Não serão permitidos comentários com "links" ou que contenham o símbolo @.