Publicado
em 29/03/2012 por *Mair
Pena Neto
Foram
precisos muitos governos após a recuperação da normalidade democrática, e,
principalmente, os dois últimos, para que o Brasil começasse a enfrentar a
história dos anos de ditadura militar. Mesmo assim, as propostas originárias do
poder Executivo, embora representem avanço, ainda esbarram em certos limites,
como a Lei da Anistia, muito mais imposta pelos militares que deixavam o poder
do que um pacto da sociedade por uma transição política
pacífica.
A
aprovação da Comissão da Verdade, com todas as suas limitações, já foi
suficiente para deixar militares e civis envolvidos com a ditadura em polvorosa.
Muitos temem seus efeitos e tentam, em vão, comparar os crimes cometidos pelo
Estado com ações de resistência contra um governo
ilegítimo.
As
reações militares, promovidas, sobretudo, pela turma do pijama, que esteve
diretamente envolvida com os anos de chumbo, ganha cada vez mais o contraponto
da sociedade, que deseja ver essa história passada a limpo e não aceita que o
hediondo e imperdoável crime da tortura seja jogado para debaixo do tapete como
algo tolerável.
A
juventude que foi às ruas em várias cidades do país nos últimos dias para
protestar contra a impunidade de torturadores trouxe um frescor aos anseios da
sociedade brasileira, pondo fim aos argumentos de suposto revanchismo na
Comissão da Verdade e em suas conseqüências. Militares que reagem ao
esclarecimento da verdade acusam o governo e movimentos sociais de revanchismo.
Tentam reduzir a necessidade de esclarecimentos de crimes ao desejo de uma
geração que teria sido derrotada por eles.
As
ações dos jovens, assim como a dos procuradores que buscam caminhos para julgar
crimes não resolvidos, como os seqüestros sem aparecimento dos corpos, mostram
que o desejo de conhecer a verdade sobre aquele período e o repúdio à tortura
não se restringem à geração que enfrentou a ditadura com armas na mão. Assim
como aconteceu nos países vizinhos, que também passaram por ditaduras, o Brasil
quer e precisa esclarecer tudo o que se passou nos porões da ditadura, e apontar
os responsáveis.
Os
jovens que foram às ruas fizeram isso à sua maneira, pichando calçadas e muros
com a inscrição “aqui mora um torturador”.
Vizinhos
incautos se surpreenderam ao saber que conviviam com monstros que se faziam
passar por cidadãos respeitáveis. Essa exposição pública dos torturadores já é
uma boa forma de punição. Eles não têm o direito de viver como se nada tivesse
acontecido.
Até
porque são capazes de expor novamente sua bestialidade diante de determinados
episódios, como o personagem Roberto, do filme argentino “A história oficial”,
que, desesperado com a revelação de sua cumplicidade com a ditadura e da adoção
criminosa da filha de uma prisioneira política assassinada pelo regime, fecha a
porta sobre a mão da própria mulher.
*Mair
Pena Neto
: jornalista
carioca. Trabalhou em O Globo, Jornal do Brasil, Agência Estado e Agência
Reuters. No JB foi editor de política e repórter especial de
economia.
Enviado
por Direto da
Redação
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