quarta-feira, 28 de março de 2012

França 2012: “Dois filmes de campanha da Front de Gauche”


[Frente de Esquerda], França 2012, candidato Jean-Luc Mélenchon.
Traduzido pelo pessoal da Vila Vudu


Vale a pena ver, porque é campanha eleitoral sem “pesquisa” e sem marketação mais visíveis que o discurso político. Também é campanha eleitoral em que o candidato manda mais que o marketeiro. E também é campanha em que o protagonista (real, não inventado, ficcionalizado) é a multidão.

O Brasil não vê nada parecido com isso há muito tempo, ocupados que estamos pelo besteirol do “marketing político”, movido a pesquisas “de preferências” que recebemos prontas dos EUA, quando não, também, dos cursos de “comunicações” e publicidade sempre e só, “comunicações” e publicidade comerciais.

Interessante, também, ver candidato que cuida de demarcar um campo e um discurso, antes de apresentar projeto de governo. E Mélenchon não está facilitando para Hollande. Em Lille, em resposta irônica a Hollande (que disse “We are not dangerous”, sempre preocupado em não espantar os votos liberais e ‘moderados’), Melenchon disse: “Nós somos comunistas. We are dangerous!”

Primeira parte


Na reunião, o candidato Jean-Luc Melenchon diz:

“Agora, chego à 6ª. República. Quero a Bastilha. Dia 18 de março, temos uma nova atividade de campanha. É a manifestação pela 6ª. República. É a primeira vez que se faz isso em campanha eleitoral, em manifestação de rua, sobre um ponto forte do programa. Portanto, a partir daí, a Front de Gauche passará a ser identificada a uma nova república. Tudo que fizermos dia 18 de março tem de ser espetacular, sempre a relação de forças, a demonstração de força. E com a nossa estética. Muitas bandeiras vermelhas. Um pouco mais de bandeiras vermelhas, por favor. Um dia inteiro, a Comuna de Paris, a nova república, tan-tan, tan-tan, quer dizer, grandioso”.

No ônibus, o senhor cantarola:

“Há 100 anos, Comuna comum,
como operário e artesão, que lutavam pela colina.
Escutem bem o canto de Clement...”

É a chansonLa Commune”, de Jean Ferrat, 1971 (letra em La Commune) e cantada a seguir:


No final, já na Place de la Nation, o candidato diz:

“E por onde andávamos, há tanto tempo? Sentíamos falta uns dos outros. Esperávamos, uns pelos outros. Agora, nos encontramos.”
[1]
Segunda parte


O candidato, em cena do filme anterior:
“Um dia inteiro, a Comuna de Paris, a nova república, tan-tan, tan-tan, quer dizer: grandioso”.·

18/3, dia da manifestação na Place de la Nation

Manuel Bompart
Responsável pela mobilização militante: “Começa às 14h. Ainda é 1h.
Falta ainda uma hora.”

A moça no palanque: “Precisamos de sete pessoas, para carregar um cartaz montado. De preferência, três altos e três médios.

Manuel Bompart: “A praça está cheia. A manifestação já começou. Acho que vamos ultrapassar minhas previsões. Não sei dizer os números ainda, mas...”
Ouve-se a canção “On Lache Rien” [Não “afrouxamos” ], cantada por “HK et les Saltimbanks”, que diz:

Não nascemos num palácio
Não tínhamos mesada do papai
Sem-documentos, desempregados, operários
camponeses, imigrados,
sempre quiseram nos dividir
e até que conseguiram...
Desde que fosse cada um por si,
o sistema deles prosperava.
Mas teríamos de acordar um dia,
e as cabeças começaram a rolar.
Caem os direitos humanos, ante a venda de um Airbus
No fundo, a regra é uma só:
vender-se mais, pra vender mais.
A República prostitui-se na calçada dos ditadores
Não acreditamos mais em belos discursos
Os governantes são mentirosos”.

O candidato [saudado, ele ri. Há quanto tempo o Brasil não ouve uma boa, sincera, feliz risada de candidato em campanha?! Aliás... quem ri em spots de publicidade? Quando não são rostos sisudos, veem-se sempre e só ‘sorrisos’ (e sempre de dentes de um milhão de dólares [risos, risos]), mas ouvir risada, aberta, solta, isso, não se ouve nem se vê em campanha eleitoral no Brasil. Por quê?!]:
Fala o candidato: “E por onde andávamos, há tanto tempo? Sentíamos falta uns dos outros. Esperávamos, uns pelos outros. Agora, nos encontramos.
Gênio da Bastilha [olha para o Anjo, no topo da “Colonne de Juillet” [2]] , que paira sobre essa praça, cá estamos de volta, o povo das rebeliões e das revoluções na França! Somos as bandeiras vermelhas, e o vermelho das bandeiras está em nossa mão aberta, oferecida para a solidariedade, que ganha força, quando se fecha, para comunicar energia.
Somos o grito do povo, dos operários e operárias precarizados, desprezados, humilhados, abandonados. Somos o grito do povo, da mulher que põe o filho no mundo num campo de prisioneiros. Somos o grito do povo, da criança que não tem teto nem professor, quando vai à escola. Somos o grito do povo, de todos os que chegam, prontos a nos trazer o socorro de sua inteligência, de sua criatividade, e que, às vezes, mesmo vivendo em boas condições, recusam-se a aplicar a moral do egoísmo, que diz “Aproveita tu mesmo!”
Organizem-se! [3] Para repetir o 18 de março na Bastilha. Reúnam-se aos milhares! Viva a humanidade universal! Viva a França! Viva a República!”
(gritos de “Resistência!” “Resistência!” “Resistência!”)
Próximo episódio: [fala o candidato] “Para nós, o plano é o planejamento ecológico. E é, porque ideologicamente estamos convencidos. Porque consideramos o nosso dever de sermos humanos, responsáveis políticos, consequentes.”

Nesse endereço, às 2as-feiras, informe-se sobre atualizações da campanha.



Notas dos tradutores
[1] Ele repetirá esse bordão, também no discurso de Lille e na Ilha de la Réunion [NTs].
[2] A Coluna de Julho é monumento instalado na Praça da Bastilha, Paris, em homenagem aos “Três Dias Gloriosos”, as três jornadas da revolução de julho de 1830 que derrubaram Carlos V e a monarquia absoluta e instauraram a monarquia constitucional, com Luiz Felipe (“Monarquia de Julho”). Numa placa, ao pé da Coluna, lê-se: “À glória dos cidadãos franceses que se armaram e combateram na defesa das liberdades públicas, nas jornadas memoráveis de 27, 28 e 29 de julho de 1830.” No topo da coluna, há uma escultura de bronze dourado, “O Gênio da Liberdade”.
[3] E m Lille, dia 27/3, o candidato repetirá esse “Organizem-se!”: “Organizem-se! Cabe a nós! A nós! Tomem a iniciativa! Sempre preferimos corrigir eventuais erros da ação, a nos condenar aos erros da inação.” Sobre o discurso de Lille, há boa matéria no Libération

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