Gareth
Porter, 29/2/2012, Consortium News
Traduzido
pelo pessoal da Vila
Vudu
Comentário
de internauta Eduardo
Cohen - on March 1, 2012 at 8:48 am - no
blog Consortium News (traduzido):
Lembro
de ter lido sobre a recente viagem da comissão da AIEA ao Irã, em que se dizia
que a visita seria ocasião para conversas e negociações para resolver as coisas,
de modo a sair do impasse atual. Para isso, evidentemente, o Irã convidou a AIEA
para nova visita.
Mas
a delegação da AIEA, no instante em que chegou ao Irã, imediatamente exigiu que
o Irã desse acesso a instalações militares, para uma inspeção não prevista até
aquele momento. Evidentemente, as autoridades iranianas não concordaram com
admitir inspeção a instalações militares, naquelas circunstâncias.
Tudo
sugere que a coisa tenha sido ‘armada’ – planejada e levada a efeito pela
comissão da AIEA para desmoralizar o Irã. Mas, em vez de questionar as estanhas
circunstâncias que cercaram a repentina ‘exigência’ da AIEA, ou os motivos que
levaram a AIEA a ‘exigir’ visita não discutida previamente, a imprensa-empresa
nos EUA pôs-se, obedientemente, a papagaiar os releases oficiais norte-americanos: que os iranianos
teriam impedido uma visita de inspeção da AIEA.
Parece
que, sob a liderança do atual diretor-geral, Yukiya Amano, a AIEA está ainda
mais rendida à influência dos EUA e de Israel do que antes, na gestão de Mohamed
ElBaradei, que várias vezes resistiu às tentativas dos EUA e de outras “nações
ocidentais”, que insistem em politizar o trabalho e os relatórios da
AIEA.
Por
isso, provavelmente, o governo dos EUA tanto se empenhou em promover a
candidatura de Amano, para substituir ElBaradei.
Obrigado
por uma boa análise.
Gareth Porter |
Os
noticiários divulgaram, semana passada, que o Irã recusou-se a permitir que a
comissão da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) vistoriasse
instalações militares em Parchin, notícias baseadas exclusivamente em
declarações a alguns repórteres, do vice-diretor geral da AIEA, Herman
Nackaerts, segundo o qual “não nos deixaram entrar”.
De
fato, declarações sobre o mesmo fato, do embaixador do Irã à AIEA e até os
termos do novo relatório da AIEA indicam que o Irã não impediu a visita à base
militar per se; o Irã apenas não
liberou a visita porque aquela visita não estava prevista nas discussões
preparatórias e não havia qualquer acordo discutido com a AIEA sobre os termos
daquele contato nem sobre qualquer visita a instalações militares.
Novas
e melhores informações confirmam o que escrevi dia 23/2. Dada a história das
negociações entre Irã e a AIEA, e o acordo, de 2005, para duas visitas da AIEA
às instalações em Parchin, o acesso àquelas específicas instalações converteu-se
em item com o qual o Irã tem barganhado para forçar a AIEA a moderar suas
exigências e para que se chegue a acordo razoável sobre a investigação que a
AIEA conduz, há anos, sobre “Possíveis Dimensões Militares” do programa nuclear
iraniano.
Em e-mail enviado a mim e em entrevistas ao canal de
televisão Russia Today, à
agência Reuters e à Agência de Notícias Fars, o representante permanente do Irã
na AIEA, Ali Asghar Soltanieh, disse à missão de alto nível da AIEA que a
comissão teria acesso liberado para visitar Parchin, imediatamente depois de
haver acordo claro sobre as condições de cooperação entre o Irã e a
AIEA.
Ali Asghar Soltanieh |
“Declaramos
que, tão logo houvesse acordo claro sobre os termos da cooperação, liberaríamos
a visita [a Parchin]” – Soltanieh escreveu em
e-mail que
recebi.
Na
entrevista ao canal Russia
Today, dia 27/2, noticiada pelo jornal israelense Haaretz e por
The Hindu na Índia, mas
não na imprensa ocidental, Soltanieh comentou duas visitas da AIEA às
instalações em Parchin, em janeiro e novembro de 2005; disse que o Irã precisa
obter “garantias” de que “não se repetirá aquela amarga experiência, quando eles
chegaram e exigiram que autorizássemos a visita”.
Disse
que era indispensável preparar um “quadro de referências e modalidades, com
detalhamento preciso do quê, afinal, estão procurando; e a AIEA teria de
apresentar documentos que comprovassem o objetivo da visita, detalhando onde,
exatamente, queriam [ir]” – disse Soltanieh. (...)
O
texto do relatório da AIEA, datado de 24 de fevereiro, oferece informação
crucial sobre a posição dos iranianos nas conversações, que correspondem
exatamente ao que Soltanieh diz. No relato da primeira rodada de conversas, no
final de janeiro, sobre o que a AIEA chama de “abordagem estruturada para o
esclarecimento de questões importantes”, a AIEA diz:
“A
Agência solicitou acesso às instalações em Parchin, mas o Irã não autorizou a
vista naquele momento [itálicos meus]”.
É
mais que claro, nessa formulação, que o Irã estava disposto a permitir a visita,
se algumas condições fossem acertadas previamente.
Sobre
os encontros dos dias 20-21 de fevereiro, a AIEA escreveu que o Irã “declarou
que ainda não havia condições para permitir a visita àquelas instalações”.
Havia, evidentemente, uma situação complexa de negociações sobre a visita às
instalações de Parchin, que Nackaerts deixara sugerida e alguns veículos de
imprensa noticiaram.
Mas
nenhuma das grandes empresas-rede de notícias comentou a diferença significativa
entre a cobertura inicial da questão do acesso a Parchin e a informação que hoje
se conhece do relatório da AIEA e de Soltanieh. Nenhuma das grandes
empresas-rede de notícias acompanhou o que dizia o relatório, no qual se lê
claramente que o impedimento àquela visita era impedimento limitado às condições
“naquele momento”.
Só
a AFP e a Reuters ouviram Soltanieh. A Reuters, que o entrevistou, citou
palavras dele: “Era bem claramente subentendido que, depois de haver acordo
sobre a modalidade da visita, o acesso seria liberado.” Mas essa citação literal
só aparecia na última frase do artigo, depois de vários parágrafos em que se
repetia várias vezes a acusação de que o Irã “impediu a AIEA de visitar
Parchin”.
Um
dia depois de publicar aquela matéria, a Reuters publicou outro artigo focado no
relatório da AIEA, mas sem qualquer referência nem ao que efetivamente se lê no
relatório sobre Parchin nem aos esclarecimentos que a agência ouviu de
Soltanieh.
O Los Angeles Times ignorou completamente a nova informação e
simplesmente repetiu a acusação de que o Irã “não permitiu que os inspetores da
AIEA visitassem as instalações militares da base de Parchin.” Em seguida,
acrescentava sua própria opinião-interpretação, segundo a qual “o Irã recusou-se
a responder perguntas chaves sobre o desenvolvimento de seu programa nuclear”.
As várias afirmativas dos agentes iranianos foram simplesmente descartadas como
se não fossem respostas qualificadas.
Hoje,
o romance do acesso a Parchin entrou em nova fase, com matéria da Reuters que
cita o vice-diretor geral Nackaerts, em reunião de atualização e briefing para diplomatas, segundo o
qual haveria “atividades em andamento em Parchin, o que acrescenta urgência aos
motivos pelos quais temos de visitar aquelas instalações militar”. Nackaerts
atribuiu tal ideia a um “membro de Estado”, cujo nome não disse, que teria
sugerido que o local estaria sendo “esvaziado”.
A
identidade desse “membro de Estado”, com o qual a AIEA já se comprometeu mais do
que a prudência recomenda ao insistir em esconder, é importante, porque, se for
“membro de Estado” de Israel, só reforçará o empenho, já bem evidente, de
convencer o mundo de que, sim, o Irã estaria construindo armas
atômicas.
Mohamed ElBaradei |
O
ex-diretor geral da AIEA Mohamed ElBaradei conta à pág. 291 de suas memórias:
“No final do verão de 2009, os israelenses entregaram à AIEA documentos
produzidos por Israel que supostamente comprovariam que o Irã teria continuado
as pesquisas com armas nucleares pelo menos até 2007” .
A
imprensa tem obrigação de alertar os leitores sempre que divulgar informação
cuja única fonte seja algum “membro de Estado” não identificado, sobretudo em
assuntos sensíveis, como um programa clandestino que estaria em andamento no Irã
para produção de armas atômicas. Em todos os casos, pode tratar-se de Estado com
enormes interesses políticos investidos na divulgação de uma ou outra mentira.
Mas, como todos vimos na cobertura jornalística dos contatos entre a AIEA e o
Irã, os “manuais de redação” em uso nada ensinam sobre esses
detalhes.
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