18/3/2012, Franklin
Lamb, Veracity Voice
Traduzido
pelo pessoal da Vila
Vudu
Dr. Franklin Lamb é
diretor do grupo “Americans Concerned for Middle East Peace”, Beirut-Washington;
é membro da Fundação Sabra Shatila; e militante a favor de direitos humanos para
os palestinos, no Líbano. É autor de The
Price We Pay: A Quarter-Century of Israel’s Use of American Weapons Against
Civilians in Lebanon
[O
preço que pagamos: 25 anos de uso de armas norte-americanas contra civis no
Líbano]. Vive no Líbano.
Recebe
e-mails
em
fplamb@gmail.com
Dia
6/3/2012, o Serviço de Pesquisas do Congresso dos EUA [orig. US Congressional
Research Service, CRS] divulgou relatório ao Congresso dos EUA, sobre uma
lei vigente que impõe restrições ao uso de armamento fabricado nos EUA, pelos
países que recebem essas armas. Para os que acompanham o assunto, não há grande
novidade no relatório do CRS, por mais que Israel continue a violar
rotineiramente praticamente todas as leis norte-americanas criadas para regular
o modo como são usadas as armas norte-americanas entregues a outros
países.
[1]
Segundo
nos disse um pesquisador do CRS que pediu para não ser identificado, em
conversa pelo Skype e, depois, em
memorando enviado por e-mail:
“Um
estagiário e eu decidimos, quase de brincadeira, contar as violações das leis de
uso de armas americanas por Israel, desde a aprovação da Lei AECA
[US
Arms Export Control Act]
, em 1976, até o mês passado [fevereiro de 2012]. Estimamos que tenha havido
mais de 2,5 milhões de violações, se se consideram as leis vigentes, a história
legislativa e o objetivo do Congresso ao aprovar aquela lei. Para essa
estimativa, consideramos todas as violações do Acordo ACEA e da lei de
1961, de Assistência Militar a outros países [orig.Foreign
Assistance Act].
Consideraram-se vários tipos de armas, munição US 155 mm , vários tipos de
mísseis, bombas, foguetes e, evidentemente, bombas de fragmentação. Por exemplo,
se Israel fosse julgada por infringir leis vigentes, a promotoria teria como
provar facilmente que as bombas de fragmentação lançadas contra o Líbano em 2006
foram violação “extra”, além das mais de 2 mi de bombas usadas na invasão do
Líbano e nas invasões subsequentes (1978, 1993 e 1996). Se se somam também as
vezes que Israel usou armas norte-americanas contra Gaza, Cisjordânia e Síria, o
número real de violações daquelas leis chegará facilmente a vários milhões.
Todas acobertadas pela mais completa
impunidade”.
Nos
termos da lei norte-americana, o governo dos EUA é obrigado a impor condições
muito estritas ao uso contra populações civis, de armas entregues a países
estrangeiros pelos EUA. Violações dessas condições podem levar à suspensão de
fornecimento de armas norte-americanas ou ao cancelamento de contratos e, em
caso extremo, ao cancelamento de toda ajuda militar ao país
violador.
A
sessão 3(a) da Lei AECA fixa os critérios para que países sejam elegíveis
para receber armas norte-americanas e fixa claramente as condições sob as quais
aquelas armas podem ser usadas. A sessão 4 da Lei AECA determina que
armas norte-americanas podem ser vendidas a nações amigas “para uso exclusivo em
atos de autodefesa legítima” e na “segurança interna” e para capacitar alguns
países a participar de “medidas coletivas exigidas pela ONU com o objetivo de
manter ou restaurar a paz e a segurança internacionais”.
No
caso de que o Presidente do Congresso entenda, nos termos do disposto nas seções
acima da Lei AECA, que houve “violação substantiva” de acordo aplicável a
venda de armas, o país envolvido naquela compra torna-se automaticamente
inelegível para receber qualquer outro tipo de arma norte-americana. O mesmo ato
proíbe que os EUA deem aval, garantias em empréstimos ou participem em outros
negócios com o país violador, que ficará impedido, até, de receber armas por
efeito de compras já feitas ou contratos vigentes.
Os
EUA só usaram uma vez essa via, contra Israel.
No
verão de 1982, questões levantadas por pesquisadores em Beirute e pelo
jornalista Jonathan Randal do Washington Post, sobre o uso, por Israel,
de armas e equipamentos militares fornecidos pelos EUA no Líbano, em junho e
julho daquele ano, levaram o governo Reagan a declarar, dia 15/7/1982, que
Israel “teria possivelmente” violado o Acordo de Assistência para Mútua Defesa
EUA-Israel [Mutual Defense Assistance Agreement with the United States (TIAS
2675)] de 23/7/1952 e a Lei AECA.
Nos
termos do acordo entre EUA e Israel de 1952, “O governo de Israel assegura ao
governo dos EUA que tais equipamentos, materiais ou serviços que sejam
adquiridos dos EUA (...) são necessários e serão usados exclusivamente para
manter a segurança interna, na legítima autodefesa de Israel, ou para permitir
que Israel participe na defesa da área na qual está inserida, ou de ações e
medidas de segurança coletiva ordenadas pela ONU; e que Israel não empreenderá
nenhuma ação de agressão contra qualquer outro estado”.
Naquela
ocasião, todas as preocupações centravam-se na questão de se Israel teria ou não
usado bombas de fragmentação fornecidas pelos EUA contra alvos civis, no
bombardeio massivo contra a área oeste de Beirute, durante o sítio de quase três
meses.
A
Comissão de Assuntos Exteriores da Câmara de Deputados dos EUA organizou
audiências públicas sobre essa questão, em julho e agosto de 1982. Dia
19/7/1982, o governo Reagan anunciou que passava a proibir novas exportações de
bombas de fragmentação para Israel. A proibição foi levantada pelo mesmo governo
Reagan em novembro de 1988, sob pressão do lobby pró-Israel sobre a Casa
Branca, que ameaçou boicotar a campanha eleitoral de George H. W. Bush, que
concorria contra o senador Walter Mondale.
Os
fatos desse evento, centrado em eventos ocorridos no Líbano, são
instrutivos.
Durante
a guerra do Ramadan de 1973,
a primeira-ministra de Israel, Golda Meir, vendo que as
forças árabes avançavam sobre Israel, depois da ofensiva síria e egípcia de
6/10, e alertada pelo ministro israelense da Defesa sobre o desastre iminente,
ameaçou o presidente Nixon: Israel usaria bombas nucleares, a menos que os EUA
viessem em socorro de Israel. A resposta imediata de Nixon foi ordenar embarque
imediato, para Israel, por avião, das armas norte-americanas armazenadas para
uso na guerra do Vietnã, na base Clark da Força Aérea dos EUA, próxima da Baía
Subic, nas Filipinas. O comandante daquela base demitiu-se, depois de responder
a Washington que, com os EUA já na defensiva no Vietnã, aquelas armas eram
necessárias para os soldados norte-americanos. Entre as armas armazenadas na
base Clark havia oito tipos de bombas norte-americanas de fragmentação,
inclusive as M-42, M-46,CBU-58 A/B, APAM (BLU) 77/B, MK 20 “Rockeye”, MK 118 e
as “Birdies”, que era como os Marines em Beirute referiam-se às M-43 no
final de 1982 e 1983.
Durante
um encontro no final de junho de 1982 com o primeiro-ministro Begin de Israel,
Reagan recebeu um bilhete escrito à mão, de George Shultz. Baseado na informação
que tinha em mãos, Reagan disse diretamente a Begin que os EUA tinham informação
confiável de que Israel estava usando armas norte-americanas contra civis no
Líbano. Nesse ponto da conversa, nas palavras de Reagan, Begin deu sinais de
intensa agitação. Tirou os óculos, olhou diretamente para Reagan e apontou-lhe o
dedo: “Senhor presidente, Israel nunca usou e nunca usaria armas
norte-americanas contra civis, e dizer o contrário é libelo mortal contra todos
os judeus, em todo o mundo”. Imediatamente depois do encontro, Reagan disse ao
secretário de Defesa Casper Weinberger, como relatam o próprio Weinberger e
vários biógrafos de Reagan, que “eu não sei o que significa “libelo mortal”, mas
sei que o homem olhou-me diretamente nos olhos e mentiu para
mim”.
A
sugestão original do secretário de Estado George Schultz a Reagan, de que Israel
estava usando dois tipos (as M-42 e as CBU-58) de bombas de fragmentação
norte-americanas foi logo transformada e divulgou-se a “explicação” segundo a
qual Israel, de fato, usara todos os oito tipos de bombas de fragmentação
norte-americanas que Nixon enviara a Golda Meir, em outubro de
1973.
Mas
no final de julho de 1982, apresentaram-se provas de que Israel usara os oito
tipos de bombas norte-americanas de fragmentação, numa assembleia do Pentágono e
outros altos oficiais, no prédio da Indian Head Ordnance, no rio Potomac, ao
sul de Maryland, segundo depoimento da falecida jornalista americana Janet Lee
Stevens. Ali se expuseram provas materiais ainda preservadas, inclusive fotos e
bombas de fragmentação, algumas das quais ainda cheias de minol, elemento
altamente explosivo, que carreguei pessoalmente na minha mala; todo esse
material foi recolhido pela jornalista Janet e sua equipe de pesquisa (na qual
trabalhavam combatentes palestinos enviados por Yassir Arafat e Khalil al Wazir
(Abu Jihad), alguns combatentes Marabatoun, vários homens da milícia Amal e eu,
para ajudar na tarefa de recolher provas).
O
lobby EUA-Israel, não por acaso, considera absolutamente inócuas as leis
norte-americanas sobre controle do uso de armas norte-americanas. As proibições
contra Israel usar armas norte-americanas contra civis jamais foram
consideradas, e como tudo indica jamais serão consideradas, dentre outros
motivos porque o governo israelense mantém a ocupação de praticamente todo o
governo dos EUA.
O
valor antigamente tão prezado de todos os cidadãos norte-americanos, de viverem
em nação erguida sobre leis humanitárias, e a confiança de que o interesse da
segurança nacional dos EUA seria defendido por política externa que brotasse da
convicção de que todas as nações são iguais e merecem idêntico respeito, foram
sacrificados, para retardar o mais possível o inevitável colapso da empresa
colonial de apartheid que Israel tentou implantar na
Palestina.
A
genuflexão de Obama (“nosso apoio é incondicional”) ante Israel aumenta os
riscos que pesam contra os EUA, os quais, hoje, já ameaçam com armas
norte-americanas todo e qualquer país, no Oriente Médio, e além dele, que sequer
considerem a possibilidade de confrontar a aspiração sionista de dominação
regional.
É
mais que hora de os cidadãos norte-americanos retomarem para eles mesmos o
próprio país e voltarem a se integrar à comunidade das nações, em atitude de
mútuo respeito por todos os países e por todos os povos, sem permitir que os EUA
continuem comprometidos em alianças espúrias com seja quem
for.
Nota
dos tradutores
[1]
O relatório “U.S. Defense Articles and
Services Supplied to Foreign Recipients: Restrictions on Their Use”,
assinado por Richard F. Grimmett, especialista em segurança internacional,
distribuído dia 6/3/2012, de apenas 7 laudas, e que parece ser documento
burocrático, que não avança além de “possíveis violações” ocorridas até
1985..
Sobre
Israel, lê-se lá, em 2012:
“Em
duas ocasiões surgiram questões sobre uso impróprio que Israel teria dado a
armamento produzido nos EUA, mas o presidente (governo Reagan) concluiu
expressamente que não houvera qualquer violação do acordo sobre uso de armas:
dia 1/10/1985, Israel usou aviões que lhe foram fornecidos pelos EUA para
bombardear o quartel-general da OLP na Tunísia; o governo Reagan declarou logo
depois que o ataque israelense fora “expressão compreensível da necessidade de
autodefesa”, embora “não se possam desconsiderar os efeitos do bombardeio
propriamente dito”. E dia 14/6/1976, depois da missão israelense de resgate no
aeroporto do Entebbe, Uganda, o Departamento de Estado dos EUA declarou
oficialmente que o uso pelos israelenses de equipamento militar fornecido pelos
EUA naquela operação acontecera conforme os termos de acordo vigente desde 1952
entre EUA e Israel” (p. 6).
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